Resumo referente ao trabalho MÉTODOS AUTOCOMPOSITIVOS NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO: EFETIVIDADE DO ACESSO À JUSTIÇA OU FORMA DE ABRANDAMENTO DA CRISE DO JUDICIÁRIO? apresentado no XIII Seminário de Pesquisa da Universidade Estácio de Sá do Rio de Janeiro, realizado em 24/09/2022
Em uma realidade de alto grau de litigiosidade e excessiva duração das ações judiciais em nosso país; muito se tem discutido acerca da celeridade e eficiência da prestação jurisdicional; surgindo a constatação de que o acesso à justiça não pode ficar restrito a possibilidade de ingresso ao Poder Judiciário; devendo abranger outras formas de resolução de controvérsias; dentre as quais se apresentam os métodos autocompositivos para a solução de conflitos; sobretudo a mediação e a conciliação; que vêm sendo positivados em nossa legislação e são considerados como meios possíveis de permitirem alcançar a pacificação social com a mínima interferência do Estado. Assim; desenvolveu-se o presente estudo no sentido de perquirir se tais métodos; da forma como estão previstos e vêm sendo empregados; efetivamente contribuem para o acesso à justiça às partes litigantes em um processo judicial. Este trabalho visa analisar se os meios autocompositivos previstos em nossa legislação processual civil estão se prestando a garantir a efetivação do direito ao acesso à justiça ou a desafogar o Poder Judiciário com a diminuição dos processos em tramitação e abrandamento da crise que enfrenta. Nesse sentido; realizou-se uma pesquisa sobre a atual concepção de acesso à justiça; diante do viés de direito fundamental constitucionalmente garantido. Procedeu-se; ainda; há uma análise sobre a possibilidade dos métodos autocompositivos de resolução de conflitos serem utilizados para promoverem a efetivação do acesso à justiça; bem como das disposições referentes aos citados métodos no novo Código de Processo Civil. a metodologia utilizada fundamentou-se em uma análise exploratória; sustentada em pesquisas bibliográfica e documental sobre o tema; com abordagens de posições doutrinárias e análise da legislação. com base nos levantamentos realizados a partir de posições doutrinárias e da legislação pertinente; constatou-se que com o surgimento do neoconstitucionalismo; estabelece-se o rompimento definitivo com a mera tutela formal a direitos; buscando-se a sua efetiva proteção; assim como dos valores protegidos pelo constituinte. Nessa linha; o direito de ação; mais do que uma possibilidade de propositura de ação; deve significar um direito de acesso à justiça; garantia essencial à dignidade da pessoa humana; materializando-se por meio de um processo que se conclua dentro de um prazo razoável e que conduza a uma decisão justa para as partes. Como forma de tornar efetivo o acesso à justiça; apresentam-se os métodos autocompositivos de solução de conflitos; destacando-se a mediação e a conciliação; os quais passam a ganhar notoriedade no cenário processual brasileiro em 1995; com a edição da Lei n.o 9.099. Tais métodos representam uma possibilidade tangível de cada indivíduo envolvido exercer sua cidadania plena; eis que participam ativamente na construção de soluções satisfatórias a seus próprios conflitos e que melhor se amoldam aos seus interesses; proporcionando maior comprometimento com a realização do acordo entabulado. Mais recentemente; surgiram no ordenamento jurídico brasileiro o N ovo Código de Processo Civil que introduziu a conciliação e a mediação definitivamente no processo civil pátrio; e a Lei n.o 13.140/2015; que dispôs sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. no que refere especificamente ao CPC; objeto dessa pesquisa; constatou-se que a audiência de conciliação ou de mediação configura-se como o primeiro encontro entre os litigantes; sendo essa audiência a regra do procedimento e sua dispensa a exceção. São priorizados os métodos autocompositivos da conciliação e da mediação; mas abre-se espaço para que outros meios também possam ser empregados; indiferentemente da fase processual em que se encontre o processo; estimulando−se continuamente uma decisão convencionada entre as partes. O artigo 165 do referido código dispõe ainda que compete aos tribunais a criação de centros judiciários para a solução consensual de conflitos; bem como que programas de estimulo e orientação à autocomposição sejam colocados em prática. Um ponto que merece uma análise mais cuidadosa são as disposições do art. 334 do referido diploma processual; especificamente nos §§ 4o e 5o. O primeiro prescreve que a audiência de conciliação ou mediação somente não se realizará se ambas as partes se manifestarem nesse sentido; denotando uma obrigatoriedade desse ato; ainda que uma das partes não se mostre propensa a participar; o que restringe a autonomia da vontade que se configura como um dos princípios basilares dos métodos autocompositivos. Já o segundo prevê a necessidade de ser declarado; de maneira expressa nos autos do processo; o desinteresse das partes em participarem de um dos mecanismos autocompositivos de tratamento de conflito; mitigando a possibilidade de deliberação daquelas quanto a adesão aos métodos autocompositivos. Essas disposições do Estatuto Processual Civil apontam para uma imposição de autocomposição aos litigantes que tem como escopo; na verdade; a redução dos processos em tramitação no Judiciário; podendo resultar em diversos efeitos negativos; entre eles descrédito e desconfiança das partes envolvidas e seus advogados quanto aos meios autocompositivos. em razão de todo o analisado; concluiu-se que os denominados métodos de resolução adequada de disputas (RAD); entre os quais se inserem os métodos autocompositivos; com destaque para a conciliação e a mediação; configuram formas potencialmente eficazes para se tornar efetivo o acesso à justiça; concebido contemporaneamente como um direito fundamental a ser garantido. Tais métodos; mostram-se como profícuas alternativas para os indivíduos chegarem a soluções consensuais de seus conflitos sem necessidade de uma decisão adjudicativa do Poder Judiciário que atualmente se encontra assoberbado de demandas em nosso país. É preciso fazer com que os indivíduos; conheçam os métodos autocompositivos e passem a confiar que os mesmos podem auxiliá-los a resolverem as suas controvérsias sem precisarem da interferência do Estado. Necessário se faz uma mudança de mentalidade; arraigada em uma cultura litigante que concebe que só o Estado é capaz de resolver os conflitos interpessoais. Urge que se promova autonomia às pessoas para resolverem suas próprias questões; encontrando eles mesmos a soluções mais justas para as suas controvérsias; substituindo-se uma cultura litigante por uma cultura de pacificação social; onde se tenha consciência de que o acesso à justiça pode ser alcançado fora do Poder Judiciário; pelos próprios sujeitos envolvidos na situação conflituosa; pois o conceito do referido acesso não se restringe apenas a uma possibilidade de se acessar o Judiciário; mas tem uma maior amplitude que engloba a obtenção de uma decisão justa; equânime e adequada ao caso concreto que pode ser construída pelas próprias partes. Imperioso que os indivíduos conheçam que existem estruturas além do Poder Judiciário que podem auxiliá-los a acessar os métodos autocompositivos e obter a justiça que buscam; ou seja; não precisam necessariamente ingressar ao Judiciário para terem acesso aos referidos métodos. Nesse sentido; necessário se faz o envolvimento de toda a sociedade e de instituições públicas e privadas; com o estabelecimento de políticas públicas voltadas para esses objetivos. em que pese os avanços já alcançados no caminho do estabelecimento de políticas públicas com as inovações normativas levadas e efeito; enxerga-se sérios riscos de que a apropriação dos referidos métodos pelo Poder Judiciário faça com que acabem sendo incorporados como apenas uma etapa obrigatória do processo; uma fase a ser cumprida e destinada primordialmente a diminuir os feitos em andamento e aplacar a crise que o mencionado Poder enfrenta. com isso; pode-se acabar por burocratizar os institutos; inserindo-os nas engrenagens processuais muitas vezes emperradas e lentas; por diversos fatores. Além disso; as precariedades nas implantações dos centros e núcleos previstos no CPC; as deficiências na formação dos mediadores e conciliadores e a falta de qualidade na aplicação dos métodos consensuais; podem comprometer a implantação nas partes a eles submetidas de uma assimilação sobre as técnicas autocompositivas de modo a proporcionar- lhes autonomia para resolução de seus conflitos interpessoais sem a necessidade de recorrerem a estruturas estatais; mantendo-se o ciclo de alto grau de litigiosidade e comprometendo a efetivação do acesso à justiça como um direito fundamental.